terça-feira, 16 de dezembro de 2008

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Editorial

Quem somos nós quando cumprimentamos novas realidades com as mãos alagadas em preconceitos? Quem somos nós quando subimos para o primeiro lugar de um pódio ilusório, fruto de uma imaginação egoísta? Quem somos nós quando achamos que o “mais” de outra pessoa é mais pequeno do que o nosso? Quem somos nós? A 11ª edição do Diagnóstico pretende testar, provocar e suscitar questões do mesmo ou maior calibre que estas. Um formigueiro mental, uma mão no queixo por mais do que dois minutos e três tempos de um qualquer monólogo são sinais de dever cumprido.


Amélia Pita
Coordenadora do Diagnóstico

Ficha Técnica

COORDENAÇÃO: Amélia Pita

REDACÇÃO: Amélia Pita, Cláudia Faria, David Pereira, Fabiana Pimentel, Joana Cardoso, Luís Patrão, Nuno Lopes, Rita Ivo


COLABORAÇÃO: Carlos Santos, Com’Out, Neuza Barroso, Pedro Manquinho, Sílvia Cardoso

PERIODICIDADE: trimestral

TIRAGEM: 250

IMPRESSÃO: Gráfica Tortosendo


Novidades!


VER


Austrália de Baz Luhrmann
Aventura épica passada no longínquo continente australiano que relata uma história de amor, coragem e luta em plena II Guerra Mundial. Nicole Kidman e Hugh Jackman são os protagonistas.



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“UPA 2008”
Levanta-te contra a discriminação das doenças mentais” é um projecto da Associação Encontrar-se que reúne vários artistas portugueses como Xutos e Pontapés e Camané. Os lucros revertem a favor da Associação.


LER


A Audácia da Esperança - de Barack Obama
“Como ultrapassar as divergências políticas para enfrentar problemas comuns?”

Fumar, hábito ou dependência? Qual a probabilidade de ser um fumador ocasional ou social? Fumar menos cigarros tem menos riscos para a saúde?

1. Fumar é um hábito ou uma dependência?

A nicotina é uma substância psico-activa que ao ligar-se aos receptores nicotínicos do SNC liberta neuromediadores e induz sensações agradáveis como prazer, modulação de humor, aumento da vigília, excitação, redução do apetite, diminuição da dor, redução da tensão, etc. A capacidade de uma droga gerar dependência depende dos seus efeitos psico-activos e também da rapidez e da intensidade da sua absorção. A nicotina fumada do cigarro demora apenas 7 a 10 segundos a chegar ao cérebro e atinge picos de concentração muito intensos e rápidos, quase imediatos, no sangue e cérebro. Cada “passa”do cigarro é uma dose de nicotina e como um fumador fuma em média 10 passas por cigarro, um fumador de 20 cigarros/dia auto-administra, em média, 200 doses de nicotina diárias! Por outro lado, o tabaco é um produto legal, barato e de fácil acesso.
O comportamento de fumar ainda é aceite socialmente e os fumadores associam automaticamente o cigarro com os rituais do quotidiano, habituando-se a viver o dia-a-dia com o cigarro. A indústria do tabaco investe anualmente milhões em estratégias de marketing extremamente eficazes e agressivas para seduzir jovens e mulheres, manipulando crenças e atitudes sociais que se traduzem em consumo. “O tabagismo é uma epidemia que se contagia pela publicidade.” A nicotina do cigarro é muito aditiva. O efeito aditivo é devastador e é por isso que os fumadores se tornam tão facilmente vítimas da dependência tabágica. O tabagismo é uma dependência e uma doença crónica, necessitando de diagnóstico sistemático e de intervenções terapêuticas repetidas, até à abstinência completa. Quanto mais cedo se experimenta o cigarro maior é a probabilidade de se tornar dependente. Podemos concluir que o pior malefício do uso do tabaco, seja em qualquer forma (cigarro, tabaco de enrolar, cigarrilha, charuto, tabaco oral, bidis, “cachimbo de água”, etc), é causar dependência. Um fumador dependente dificilmente deixa de fumar e vai adoecer ou morrer precocemente por causa disso.

2. Porque será que alguns fumadores fumam muito e todos os dias, enquanto que outros conseguem fumar poucos cigarros e não fumar todos os dias ou apenas fumar socialmente? Fumar menos tem menos riscos para a saúde?

A maioria dos fumadores são dependentes e fuma regularmente, ou seja, todos os dias (96% dos fumadores europeus). A nicotina é muita aditiva e a maioria das pessoas que experimenta o tabaco vai repetir o consumo e ficar dependente. Alguns fumadores regulares fumam menos cigarros, por exemplo 1 a 5 cg/dia (12% dos fumadores europeus), outros até podem ter um padrão de consumo intermitente (14% dos fumadores europeus) ou ocasional regular (3% dos fumadores europeus), conseguindo não fumar todos os dias, por exemplo só ao fim de semana, quando estão com os amigos, habitualmente quando bebem álcool ou frequentam lugares da diversão nocturna. Estes fumadores são habitualmente adolescentes ou jovens adultos e podem, mais tarde, aumentar o consumo de cigarros ou passar a fumar diariamente. Poucos fumadores conseguem, ao longo da vida, não aumentar o consumo ou manter o padrão intermitente ou ocasional.

Quanto mais cedo se experimenta o cigarro, maior é a probabilidade de se tornar dependente. Aqueles fumadores que começam a fumar mais tarde, muito depois da adolescência (depois dos 25 anos), têm menos probabilidade de desenvolver dependência e podem manter este padrão. No entanto, em qualquer altura das suas vidas, poderão viver uma circunstância favorável ao aumento do consumo, como, por exemplo, stress mantido, viver e/ou conviver com outros fumadores e ambientes com fumo de tabaco ou, ainda, um episódio de depressão ou desemprego. Assim, nunca nenhum fumador está livre de aumentar o consumo ou de passar a fumar todos os dias. Os fumadores ocasionais ou que fumam menos cigarros têm mais dificuldade em deixar de fumar e sofrem dos mesmos malefícios do que os fumadores pesados. O tabaco é muito tóxico e não há consumo seguro, nem fumar pouco, nem fumar dia sim, dia não. Estudos epidemiológicos recentes que seguiram coortes populacionais de milhares de fumadores, ex-fumadores e não fumadores, ao longo de 18 a 35 anos, quantificando a carga tabágica e a duração do comportamento tabágico, suportam esta evidência científica. Estes estudos concluem que a maior diferença de risco de doença e morte prematura encontra-se entre os não fumadores e os fumadores de 1 a 4 cg/dia. Por outro lado, mesmo os fumadores ocasionais ou que só fumam socialmente podem ser dependentes - dependência psico-social. Alguns fumadores toleram mal fumar muitos cigarros seguidos ou fumar todos os dias. A explicação para estas diferenças é complexa e poderá ser em parte genética, em parte biológica e em parte social. Sabe-se que a dependência tabágica, assim como a rapidez da metabolização da nicotina e a susceptibilidade individual aos malefícios do tabaco, tem algum determinismo genético. Já foram identificados no genoma humano alguns loci responsáveis pelo perfil de fumador, susceptibilidade de doença e até resposta ao tratamento farmacológico para deixar de fumar. No entanto, a sua expressão vai ser influenciada por factores sociais como ser filho de pais fumadores e aprender o papel modelo de pai e/ou mãe fumador, ter amigos fumadores na escola, ter fácil acesso aos cigarros, biológicos como o sexo (as mulheres em regra fumam menos cigarros do que os homens) ou, ainda, ter uma personalidade impulsiva, ansiosa ou emocionalmente instável. A exposição precoce intra-uterina do feto ao fumo de tabaco, se a mãe fumar durante a gravidez e/ou se estiver exposta ao fumo do tabaco ambiental, tem efeitos muito nefastos sobre o desenvolvimento cerebral, aumentando os receptores nicotínicos cerebrais e potencializando o risco do futuro jovem ser um fumador dependente. O cérebro deste bébé vai ficar programado para fumar ou para gostar de fumar e um dia, à experimentação, pela criança ou adolescente, de um cigarro por curiosidade ou imitação do comportamento adulto, facilmente se segue outro cigarro até se estabelecer a dependência. Existem cada vez mais estudos a provar esta relação e daí ser tão importante ensinar as grávidas a não fumar e a se protegerem da exposição ao fumo do tabaco.


Autores:

  • Sofia Belo Ravara, Médica Pneumologista, Mestre em Tabagismo, Assistente de Medicina Preventiva, Epidemiologia, Saúde Pública e Comunitária da FCS da UBI. Responsável pela Consulta de Cessação Tabágica do Centro Hospitalar da Cova da Beira, EPE. Membro da Direcção da Sociedade Portuguesa de Tabacologia, Membro da Sociedade Espanhola de Especialistas de Tabagismo. Secretária da Comissão de Tabagismo da Sociedade Portuguesa de Pneumologia.
  • José Manuel Calheiros, Médico Internista, Professor Catedrático de Medicina Preventiva, Epidemiologia, Saúde Pública e Comunitária. Director do Serviço de Higiene e Segurança no Trabalho do Centro Hospitalar da Cova da Beira, EPE. Presidente da Sociedade Portuguesa de Tabacologia. Membro da Sociedade Espanhola de Especialistas de Tabagismo.

Nós cá dentro... Eles lá fora...

Nós cá dentro...

No momento em que preenchi o boletim de candidatura para a universidade, aquilo que julgava ser a vida académica não correspondia à realidade. Desde o medo da primeira praxe, à euforia da latada, tudo passou demasiado depressa. O método de estudo foi completamente inovador e de início senti alguma dificuldade em habituar-me. Os meus únicos pensamentos eram: "não vou conseguir", "quero voltar para minha ilha, para junto da minha família". Contudo, graças à praxe e à latada, cultivei novas amizades e percebi que era possível conciliar o estudo com a diversão. Três meses após a minha chegada a realidade já é outra… Apesar de nunca esquecer o Pico, já adoptei a Covilhã como segundo lar.


Fabiana Pimentel, aluna do 2º ano da FCS (Medicina)

Eles lá fora...

Tendo nascido e vivido até os meus dezoito anos em Portugal, decidi fazer os estudos de Medicina na Université Catholique de Louvain (UCL), na Bélgica, escolha que não parte de um acaso, uma vez que tenho laços familiares com a capital europeia, mas que foi sobretudo motivada pela vontade de mudar radicalmente de ambiente e provar um pouco daquilo que a globalização nos pode oferecer: mobilidade.


Após ter, praticamente, concluído o meu quarto mês de faculdade na terra do Tintin, venho partilhar a experiência com os meus conterrâneos e futuros colegas de ofício, esperando de algum modo motivá-los para a aventura que é estudar num país que não é nosso.


Em jeito de metáfora, classificaria o primeiro ano de Medicina na Bélgica como um autêntico copo misturador que, após 9 meses de centrifugação, dá luz, não a um batido pestilento, mas a um conjunto de “verdadeiros” alunos de Medicina. Isto porque, contrariamente ao sistema de ensino português, que orienta desde cedo os jovens para determinados agrupamentos que restringem o leque de cursos a que temos acesso quando nos candidatamos ao ensino superior, o belga concede muita margem de manobra aos estudantes. Resultado: deparo--me com muitos colegas que nem fizeram o agrupamento de ciências no secundário, outros ainda, não pouco frequentes, que estudaram línguas mortas! Um tanto indiferentes às nossas sobrepesadas médias, as universidades belgas também abrem portas a estudantes medianos que queiram tentar a sua sorte em Medicina. Tudo isto resulta num primeiro ano que é a verdadeira prova de fogo que visa, por um lado, colocar todos os alunos no mesmo patamar de conhecimentos básicos e por outro, seleccionar os mais aptos. Qual dos melhores, um sistema que “corta o mal pela raiz”, como o nosso, ou um sistema que facilita o acesso, optando por uma selecção a posteriori, como o belga? É uma questão discutível sobre a qual prefiro não me pronunciar...


Assim sendo, o primeiro semestre assemelha-se a um “13º” que abarca tudo o que nós, portugueses, damos no secundário em Biologia, Física e Química, aprofundando, claro, os conhecimentos. Daqui surge a grande dor de cabeça chamada “Física Experimental” que, certamente não despertando curiosidade absolutamente alguma por parte dos leitores, se contenta com a breve menção. O segundo semestre já conta com algumas disciplinas mais específicas da Medicina, como a Anatomia, a Histologia e a Bioquímica mas, contas feitas, a Medicina em peso só chega no segundo ano...


Na óptica da selecção, a avaliação é feita quase na totalidade através dos exames finais, em Janeiro para o primeiro semestre e em Junho para o segundo, com possibilidade de se recorrer a uma segunda fase em Setembro para repassar exames com nota inferior a 12. Uma pequena percentagem da avaliação cabe às Aulas Práticas e... uma vez que o texto começa a tornar-se soporífero, passo a meandros mais interessantes da vida estudantil.


Antes de mais, a faculdade de Medicina da UCL não se situa no campus principal da universidade, em Louvain, mas veio implantar-se em Bruxelas, juntamente com as faculdades de Medicina Dentária, Farmácia e Ciências Biomédicas, por razões de proximidade com o Hospital universitário de Saint-Luc. Daí que, as grandes tradições académicas, praxes compreendidas, vividas muito intensa e diversificadamente em Louvain, chegam “um bocado” esbatidas a Bruxelas, após os 45 minutos de viagem de automóvel. Friso UM BOCADO porque, pelo que presenciei, o grupo de Bruxelas não brinca em serviço...


Quanto às praxes, são organizadas pelos “cercles” (círculos, em tradução à letra) das faculdades: Mémé, da faculdade de Medicina; Spix, da faculdade de Medicina Dentária e Pharma que não é mais do que uma “coligação” (pouco revelada na nomenclatura utilizada) entre os alunos de Farmácia e os de Ciências Biomédicas.


Ao contrário das praxes em Portugal, reservadas aos alunos do primeiro ano para fomentar o companheirismo entre os caloiros, as praxes belgas, ou usando a expressão correcta, os “baptizados”, ganham feições de verdadeiros “rituais de iniciação” (a quê, já não sei responder... talvez à cerveja) que, embora mais dedicados aos caloiros recebem frequentemente alunos do segundo ou até do terceiro anos.


Qualquer caloiro tem a liberdade de escolher o cercle em que quer fazer o seu baptizado, independentemente do curso, daí que nos primeiros dias de aulas se monta uma verdadeira campanha tentando cada cercle cativar o maior número possível de candidatos a praxados, bizarramente e sem qualquer razão lógica apelidados de azuis. Conservando todos anualmente a sua popularidade, o cercle Mémé consegue arrecadar sempre o maior número de caloiros. No entanto, que não se pense que me refiro a números astronómicos...


De facto, para pessoas mais contidas, sensíveis ou conservadoras, algumas actividades dos azuis podem adquirir proporções “catastróficas”, o que junto à famosa expressão “a fama persegue-te” e à impunidade do “livre arbítrio” faz com que num ano de boas colheitas o Mémé consiga pintar de azul uns 60 dos cerca de 500 alunos de Medicina e ainda esfregar as mãos de contente se até a prova final (o dia do baptizado) “sobreviverem” 30.


Estando-se no país do chocolate mas, sobretudo, da cerveja, ela é, claro, a rainha da festa. Aproveito para mencionar a maneira peculiar como se a bebe cá, talvez devesse dizer como se a envia rapidamente para o estômago (com possível viagem de regresso) - os afundanços. Rápido e curto: dois ou mais indivíduos desafiam-se para um “afundanço” e 3...2...1...ZÉRROU a cerveja tem de ser bebida em dois tragos (talvez em apenas um, para os mais experientes). Quem esvaziar o copo primeiro ganha (juízo, para além do balde de água fria no estômago). Em suma, os azuis têm uma caderneta a preencher com as mais peculiares formas de afundar cerveja (ex.: cascata: afundar duas cervejas ao mesmo tempo, com os copos elevados, ou, melhor dizendo, apenas uma, porque a outra deve propositadamente cair em cima do corpo... bizarro, eu sei).


Para além dos malabarismos com a bebida mãe, os azuis também têm de fazer uma série de actividades físicas e ingerir tudo aquilo que a imaginação dos praxantes é capaz de alcançar (larvas; cubos de caldo Knorr; café em pó; ração para animais de estimação; etc). Existem também uma série de “mitos” que actualmente já não se realizam (ou que podem eventualmente acontecer em Louvain mas não na minha faculdade), que criam uma imagem por vezes negativa dos baptizados e repelem muitos caloiros... Embora, sublinho, não tenha presenciado nenhuma delas, menciono algumas para satisfação das curiosidades mais tormentosas: dois caloiros de sexo oposto encontram-se nus e pintados cada um com uma cor primária, tendo de fazer surgir após momentos privados de escuridão uma única cor secundária em ambos os corpos; depilação mútua; sessões de “remo” para as caloiras (deixo a tarefa de descobrir a parte do corpo masculino utilizada para o efeito às perspicácias dos leitores)... De volta à realidade concreta, resta-me mencionar a actividade mais “desconfortável”, reservada para o dia do baptizado e para os indivíduos do sexo masculino (embora algumas mentes criativas já tenham considerado, sem sucesso, aplicá-la em modo alternativo às caloiras...): após algumas horas de olhos vendados, os caloiros são forçados a “escolher”, através do tacto, o utensílio que lhes vai, supostamente, mutilar o órgão sem o qual perdem a capacidade mais essencial da natureza - a propagação da espécie. Após a rápida operação, surpreendentemente indolor, os caloiros convencem-se, aterrorizados, de que perderam efectivamente o amigo insubstituível, porque deixam efectivamente de senti-lo. Retiradas as vendas e consumado o baptizado, vêm a saber que lhes pulverizaram o mastro com éter e que terão de esperar longos minutos até se poderem considerar novamente homens... Valha-lhes o final feliz.


Engraçadas e, certamente, inesquecíveis, as praxes proporcionam claro uma forma fácil de integração para os caloiros (sobretudo se quiserem integrar os “cercles”), mas não são de modo algum essenciais, algo que se constata facilmente pela percentagem limitada de aderentes. Ao longo do ano os vários “cercles” estão também encarregues de assegurar a manutenção de uma “taxa mínima” de animação, organizando cada um a sua “soirée” todas as semanas (terça, quarta e quinta). Mesmo sendo gradualmente menos frequentadas à medida que os exames se aproximam, as “soirées” são sempre boas ocasiões para descontrair e quebrar a rotina. Ainda assim, uma vez que a grande maioria dos estudantes aluga pequenos apartamentos (“kots”) nas redondezas da faculdade, organizam-se muitos convívios pelos vários kots que contam com a presença da senhora cerveja e do tradicional poker.


Embora aluguem kots para a semana, todos os estudantes têm por hábito passar o fim-de-semana em casa dos pais o que, para estudantes estrangeiros como eu, que por força “vivem” no seu kot, acaba tornando alguns fins-de-semana pouco interessantes... Aquilo que primeiro se estranha e depois parece nunca se entranhar é o facto de a partir das 19:00 horas ser difícil encontrar aberto um estabelecimento comercial (ao Domingo, uma impossibilidade durante todo o dia), algo que já não sucede com o frio glacial e os dias invernais de sete horas.


Agora, que me aproximo do final do texto, retomo a infeliz analogia do electrodoméstico para definir o mix cultural que encontrei na UCL. De facto, é fastidiosa a lista de diferentes origens dos estudantes, poucos de linhas puras, a maioria belgas, mas de pais estrangeiros. Sem dúvida, envolvendo alguns desafios de adaptação e, quiçá, algumas privações, considero esta minha experiência enriquecedora, sobretudo pela abertura a pessoas e a mentalidades totalmente novas. A Europa proporciona-nos cada vez mais oportunidades para conhecermos aquilo que há para além de nós, quer estudando no estrangeiro, quer optando pelo Erasmus, oportunidades que, acredito, poderíamos dispensar, não fossem os portugueses, por excelência, cidadãos do Mundo.

David Pereira
Aluno do 1º ano da UCL - Université Catholique de Louvain (Medicina)

Sexualidade(s), para onde vamos…

O Departamento de Saúde Reprodutiva e SIDA (DSRS) da Associação Nacional de Estudantes de Medicina (ANEM), com representação local ao nível do Núcleo de Estudantes de Medicina da Universidade da Beira Interior (MedUBI), assume, entre outros, como objectivo primordial a sensibilização dos estudantes de Medicina e da população em geral para uma sexualidade saudável, nas suas vertentes biológica e social.

Para onde vamos, já que os conceitos e normas psico-sociais, religiosas e culturais, que definiam a noção de normalidade deixaram de se aplicar à sociedade pluralista actual? A nossa tradicional ética sexual, seguida há centenas de anos, não consegue adequar-se às mudanças sócio-culturais e aos novos desafios do Século XXI. Vivemos numa sociedade plural, onde começam a tornar-se visíveis as mais diversas expressões da sexualidade humana adulta, as quais querem ser aceites, reconhecidas e legitimadas. Expressões sexuais que demonstram maturidade, respeito e consciência entre aqueles que as assumem.

A nível social, o grande eixo de discussão é "contra o neoliberalismo, o patriarcado, por uma Europa dos direitos, social e democrática". Isto significa que entendemos que, para um novo mundo, para uma outra globalização, é premente construir uma nova ordem moral e de géneros.

A orientação sexual, quer para heterossexuais, quer para homossexuais, não parece ser algo que uma pessoa escolha. Alguns estudos recentes indicam que a orientação sexual tem grande influência genética ou biológica sendo, provavelmente, determinada antes ou pouco depois do nascimento. Se bem que estes estudos não sejam conclusivos, é irresponsável assumir que a homossexualidade é uma escolha. Existem mais provas científicas que suportam a ideia que a orientação tem uma componente genética, do que provas que indiquem que é apenas uma questão de opção. Tal como os heterossexuais, os homossexuais descobrem a sua sexualidade como um processo de crescimento, socialmente construído. A única escolha que o homossexual pode tomar é a de viver a sua vida de acordo com a sua verdadeira natureza ou de acordo com o que a sociedade espera dele.

Descrever a homossexualidade como um simples caso de escolha é ignorar a dor e a confusão por que passam tantos homens e mulheres homossexuais ao serem marginalizados pela sua orientação sexual. É absurdo pensar que esses indivíduos escolheram deliberadamente algo que os deixa expostos à rejeição por parte da família, amigos e sociedade. Importa então, definir alguns conceitos:

HETEROSSEXUAL: Uma pessoa que se sente maioritariamente atraída emocionalmente, espiritualmente e fisicamente por pessoas do sexo oposto.

HOMOSSEXUAL: Uma pessoas que se sente maioritariamente atraída emocionalmente, espiritualmente e fisicamente por pessoas do mesmo género.

GAY: Normalmente usa-se o termo para indicar o homossexual masculino. Em algumas situações pode indicar a pessoa homossexual (masculino e/ou feminino), assim como a comunidade homossexual em geral.

LÉSBICA: Homossexual feminino.

BISSEXUAL: Uma pessoa que se sente atraída emocionalmente, espiritualmente e fisicamente de forma semelhante por pessoas dos dois géneros. Algumas pessoas identificam-se como bissexuais num certo grau.

TRANSEXUAL: Uma pessoa que pensa e se comporta no seu dia-a-dia em sociedade de acordo com o género oposto ao seu sexo biológico. Dito de outra forma: uma pessoa em que o género e sexo não são coincidentes. Muitas vezes (mas nem sempre) sujeita-se a uma operação de mudança de sexo. Os termos, pré-operatório e pós-operatório distinguem os transexuais que fizeram a cirurgia de mudança de sexo dos que ainda não a realizaram. Um transexual não-operatório é uma pessoa que, por qualquer razão, não pode ou não quer ser operado.

TRANSGENDER: Indivíduo que não segue a identificação de género tradicional. Neste grupo incluem-se além dos transexuais, indivíduos que gostam de usar roupas do sexo oposto em certas situações, pessoas com aparência ambígua em termos de género, etc.

TRAVESTI: Alguém que obtém prazer ao vestir-se com roupas normalmente associadas ao sexo oposto. Se bem que os termos homossexual e travesti tenham sido utilizados como sinónimos, são de facto conceitos diferentes. A maioria dos travestis são heterossexuais.

HETEROSSEXISMO: O ponto de vista para o qual a sociedade parte do princípio que todos são heterossexuais e que os homossexuais são de alguma forma inferiores aos heterossexuais.

HOMOFOBIA: Um medo irracional e irrealista da homossexualidade. A homofobia é perpetuada pelos preconceitos e estereótipos negativos que existem à volta do termo homossexualidade. A homofobia pode levar a ódios, discriminação e violência em relação aos homossexuais. Tanto os heterossexuais como os homossexuais podem ser homofóbicos.

Fundada em 1996, a Associação ILGA Portugal é uma Instituição Particular de Solidariedade Social, sob a forma de Associação de Solidariedade Social, que tem por objectivos a integração social da população lésbica, gay, bissexual e transgéneros (LGBT), a luta contra a discriminação com base na orientação sexual e na identidade de género e a promoção da cidadania, dos Direitos Humanos e da igualdade de género.

A Associação ILGA Portugal tem ao longo dos anos desenvolvido inúmeros projectos numa base de voluntariado, entre os quais, a dinamização do Centro LGBT, a partir do qual a Associação e outros grupos têm desenvolvido as suas intervenções no âmbito cultural, social e político. O DSRS tem pensado um projecto contra a discriminação social das conhecidas minorias sexuais, tendo como principal objectivo a erradicação de alguns mitos no que a esta temática diz respeito. Este projecto será operacionalizado já em Janeiro de 2009, com moldes e objectivos específicos a divulgar oportunamente em
www.dsrs-medubi.blogspot.com.


Nuno Tavares Lopes
Coordenador DSRS-MedUBI

Entrevistas

Soren Kierkegaard deixou-nos saber que as pessoas usam a liberdade de expressão para compensar a liberdade de pensamento a que raramente recorrem. Numa sociedade com base democrática e no valor dos direitos humanos, a não aceitação de uma opção sexual é contraditória. A Com'out (uma revista dirigida à comunidade LGBT) e o José (nome fictício), homossexual, perspectivaram em termos abrangentes e pessoais, respectivamente, esta situação.


  • Entrevista à Com’Out: “Há gays que não participam pelo folclore”

Diagnóstico: Olá Eduardo! Antes de mais obrigada por acederes à nossa entrevista e parabéns pelo sucesso da revista. Porquê, como e quando surge a Com’Out? A quem se dirige?

Com’Out: A Com’Out surgiu em Julho de 2008 nas bancas. A ideia surgiu depois de uma conversa com o advogado Luís Grave Rodrigues, que defende o mediático casal lésbico (Helena e Teresa) que recorreu ao Tribunal Constitucional para se poder casar em Portugal. Nessa troca de ideias, chegou-se à conclusão que faltava uma revista dirigida à comunidade LGBT no nosso país. Uma revista que pudesse interessar a este público e a todos os heterossexuais que vêem nela um ponto de informação sobre uma realidade que desconhecem ou que apenas têm contacto por meio de amigos e familiares LGBT, mostrando uma realidade diferente e diversa de uma comunidade que se estima seja cerca de 10 por cento da população portuguesa. Se praticamente todos os países mais avançados da Europa têm, por que não Portugal?

D: Acredita no poder da palavra?

C: Se não acreditássemos este projecto não faria sentido. Esperamos que a nossa palavra venha a ter outras consequências para além das que já teve e tem. Muitos leitores ultrapassaram muitos medos e já nos agradeceram por isso. Mas ainda há muitas portas para abrir e terreno por trilhar.

D: Numa escala de 0 a 10, qual foi o nível de adesão das pessoas aquando do lançamento? Em que medida se manifestou?

C: É uma escala difícil, sempre subjectiva. Pensamos que o nível de aceitação é bastante grande e na generalidade as pessoas manifestaram--se muito surpreendidas pela qualidade da revista. Sob este prisma a escala seria 9, no prisma da divulgação ainda há muito a fazer. Sentimos que ainda muita gente não conhece ou não compra, por variados motivos, a Com’Out.

D: Falando em dificuldade na divulgação, já nos fizeram chegar a resistência, por parte de alguns postos de venda, à difusão da revista. Serão eles pequenos exemplos de um grande problema?

C: São de facto um exemplo da pequenez da mentalidade que ainda existe no nosso país. Temos consciência de que os preconceitos não são erradicados de um dia para o outro, mas esperamos que aos poucos estes focos de resistência desapareçam. Uma vez mais, sabemos que existem pontos de venda que de início não queriam a revista e agora já a pedem. Devagar vamos lá…

D: Países como o Sudão, o Irão e a Mauritânia, punem a homossexualidade com pena de morte. Há explicação para uma atitude que além de conservadora, vai contra os direitos humanos?

C: Há a explicação de uma cultura que existe desde há centenas de anos e cujas mentalidades são difíceis de mudar, principalmente quando são os próprios governos a estimular esses comportamentos homofóbicos, produzindo legislação cada vez mais dura e penalizante. São governantes que comandam na base do medo e nas leis religiosas atávicas, que interpretam à sua maneira. A ignorância a que o povo está votado, faz com que acatem tudo.

D: Em Portugal, embora se proteja a homossexualidade da pena de morte, existe ainda um forte estigma associado a orientações sexuais que não a considerada normativa. Quais as maiores dificuldades que se apresentam a um homossexual numa sociedade caracteristicamente heterossexista como a portuguesa? Pode dizer-se, no contexto da comunidade LGBT, que nascer em Portugal é um azar?

C: Não chegaríamos a esse ponto. Em Portugal não é um azar, assim como também não é uma sorte. Estamos numa espécie de limbo: já subimos alguns patamares, embora ainda haja muito por fazer. Neste momento, comportamentos fora da norma parecem ser mais tolerados, mas ainda se assiste ao domínio da hipocrisia. Muita gente faz às escondidas aquilo que condena: políticos homossexuais chumbam leis favoráveis aos homossexuais. De uma forma geral, pode-se ser gay desde que não haja manifestações públicas de afecto ou que não se seja muito evidente nos comportamentos.

D: Fala-se muito em Lesbigaytransfobia, por parte dos heterossexuais. Poderá falar-se em homofobia, no âmbito da bissexualidade? Ou o inverso? Até que ponto os vários membros da comunidade LGBT mantêm uma relação saudável e de respeito?

C: Apenas uma coisa une todos os subgrupos da comunidade LGBT: a luta contra uma sociedade homofóbica. Claro que existem ataques dentro da própria comunidade. Parece haver muita divisão e muita crítica dentro dos elementos das várias culturas: lésbicas, gays, bissexuais, trangéneros e etc. muitas vezes não convivem bem uns com os outros. Muitos gays, por exemplo, não acreditam na bissexualidade. Para eles existem, sim, pessoas com medo de assumir uma orientação exclusiva pelo mesmo sexo, uma vergonha em revelar-se como gay ou lésbica.

D: Muitas organizações, à semelhança do que acontece com a “Panteras Rosa”, presidem manifestações em defesa dos direitos da comunidade LGBT, como é o caso da parada gay. Qual a sua opinião acerca destes movimentos? Serão eles representações fidedignas e honrosas da comunidade LGBT ou, por outro lado, contributos para um estereótipo com conotação negativa?

C: Estas manifestações, por muitos detalhes que se possam criticar, têm ajudado à visibilidade de uma comunidade que está habituada a estar no armário, como se tivesse vergonha de ser quem é. Estas paradas têm um lado festivo muito efusivo, mas não se pode julgar o todo pela parte. Há gays que não participam pelo folclore. Mas se não fossem estes movimentos, não continuaria tudo como há 20 anos atrás?

D: Sabe-se que os dois projectos, do Bloco de Esquerda e do Partido Ecologista “Os Verdes”, discutidos no Parlamento, dia 10 de Outubro, a favor do casamento entre pessoas do mesmo sexo, foram indeferidos com os votos do PS, PSD e CDS-PP. Perdeu-se uma oportunidade de fazer História em Portugal?

C: Perdeu-se uma grande oportunidade para se fazer História, de sermos um dos países na linha da frente nos direitos pela igualdade. Cremos que é apenas uma questão de tempo porque, geralmente, as pessoas receiam aquilo que não conhecem, mas se lhes forem mostradas diferentes realidades, os preconceitos podem ser dissolvidos. Politicamente é prioritário mudar a legislação para que as mentalidades também mudem. Podemos ver como em Espanha a legislação ajudou a sociedade a mudar de ideias em relação aos homossexuais. A maioria não pode oprimir a minoria e têm de ser dadas as mesmas oportunidades.

D: Em que medida é urgente passar de um estado de omissão legislativa ao estabelecimento de parâmetros legais no que diz respeito à transexualidade?

C: Nos países da América Latina e Brasil têm-se dado passos de gigante no sentido de apoiar as pessoas que desejam mudar de género. Pensamos que faria todo o sentido os países da Europa seguirem o exemplo. São pessoas que precisam de todo o apoio possível, dada a sua situação já de si difícil. A dificuldade que há em mudar o nome no Bilhete de Identidade é mais um peso psicológico que os transexuais têm de suportar. Se é possível mudar de sexo, por que não apoiar o processo plenamente? É uma falta de respeito, no mínimo, fazer com que uma pessoa que mude de sexo permaneça com o seu nome original. Parece um castigo.

D: Será a adopção por casais homo/bi/transexuais uma questão de igualdade de direitos (dos heterossexuais versus comunidade LGBT) ou de defesa dos direitos das crianças a adoptar? Poder-se-á colocar a hipótese de as crianças criadas por casais homo/bi/transexuais serem mais (ou menos) propensas a homo/bi/transexualidade? Ou, em oposição, será a sinergia mais importante do que a estrutura familiar?

C: Inúmeros estudos – e são cada vez mais – têm demonstrado que as crianças adoptadas por casais homossexuais se adaptam perfeitamente à sociedade. Não há um único estudo conhecido que conclua que a criança é mais infeliz ou discriminada ou que venha a sofrer traumas. Em Espanha, a aprovação da lei da adopção e do casamento permite-nos concluir no terreno, e não só de uma forma teórica, que os casais homossexuais são tão ou mais aptos para dar amor e cuidar de uma criança, e que estas crianças crescem com uma visão menos preconceituosa e mais inclusiva. Pelo que vem a ser estudado, não permitir a adopção por casais homossexuais é completamente desajustado quando se permite deixar as crianças com famílias disfuncionais ou em instituições que as maltratam.

D: A comunidade LGBT é considerada uma minoria. Será mesmo assim, ou as estatísticas estão ainda longe da realidade? Qual o preço a pagar pela saída do armário?

C: A comunidade LGBT não pode, nem nunca poderá ser quantificada de uma forma científica. Haverá sempre quem não se assuma, nem para ele próprio. Presume-se que cerca de 10 por cento da população seja homossexual ou bissexual. Cremos que seja um número que a pecar será por defeito. O preço a pagar pela saída do armário? Família que não aceita, patrões que tornam a vida difícil, amigos que nos veêm com outros olhos, discriminação nas mais variadas formas. É preciso ser forte ou aprender a sê-lo. Uma coisa é certa pelos relatos que temos tido: não há ninguem que se arrependa de ter saído do armário. O peso que sentiam desvanece-se com o tempo e as pessoas vivem mais em pleno e de bem com elas próprias.

D: Um desejo para 2009 …

C: Que toda a gente seja e que deixe ser feliz. Aquilo que parece tão fácil é ao mesmo tempo tão difícil e não há razões para que assim seja.



  • Entrevista a "José": “Não tenho plena liberdade de expressar alguns sentimentos em público, como andar de mãos dadas com o meu namorado”


Diagnóstico: Olá José! Primeiro que tudo, obrigada pela disponibilidade e abertura com que acedeste ao nosso pedido. Pronto?

José: Claro que sim.

D: Segundo Alfred Kinsey, a classificação dos seres humanos quanto à sexualidade em apenas duas categorias: “exclusivamente homossexual” e “exclusivamente heterossexual” é errónea. Defende, por outro lado, a existência de graus intermédios, situados numa escala de zero a seis. Consideras a homossexualidade um “estado” flexível ou, em oposição, comportamentos homossexuais não se coadunam com rasgos de heterossexualidade? Qual o teu lugar nesta escala?

J: Não acredito em escalas de comportamentos. Acredito sim, que as pessoas não escolhem desenvolver sentimentos homossexuais e que quando alguém nasce não está pré-programado para ser homossexual para sempre. Por isso, penso que a homossexualidade é um estado flexível.

D: Um estudo Americano concluiu que gays e lésbicas são mais gentis e menos agressivos com os seus parceiros e, ainda, que homossexuais e bissexuais têm maior tendência para sofrer de depressão. O que tem a tua experiência a acrescentar ou retirar a estas asserções?

J: É muito subjectivo o facto de os homossexuais serem mais gentis e menos agressivos com os seus parceiros. Relativamente à depressão, a repressão da sociedade pode, de facto, conduzir a um desequilíbrio psíquico e daí a possível maior susceptibilidade.

D: Achas que, actualmente, à semelhança do que acontece com a OMS (que considerou a homossexualidade uma doença mental ate 1990), a sociedade dissocia a homossexualidade do role de distúrbios psiquiátricos?

J: Penso que sim. A sociedade está mais complacente com os homossexuais, e as novas gerações apresentam menos preconceitos e estereótipos. Acredito que ainda há um longo caminho a percorrer, mas actualmente a sociedade cada vez menos encara a homossexualidade como uma doença e mais como algo normal e natural.

D: Quais as maiores dificuldades que se apresentam a um homossexual numa sociedade caracteristicamente heterossexista como a portuguesa? Já foste alvo de algum comportamento discriminatório?

J: Normalmente as dificuldades começam dentro de casa, quando os pais descobrem que o filho é gay ou lésbica e o insultam, espancam ou até expulsam de casa. Outra das grandes dificuldades é a violência verbal na rua, nas escolas e por grande parte da sociedade que ainda se refere aos homossexuais com termos pejorativos. Eu, como homossexual não assumido, os únicos comportamentos discriminatórios de que fui alvo foram alguns insultos verbais na escola ou e na rua.

D: Além de bom rapaz és comprometido. Publicamente, esforças-te por conter demonstrações de carinho?

J: Nunca fiz grande esforço para me conter. Quando sinto necessidade de demonstrar algum carinho, faço-o discretamente. Porém, não tenho plena liberdade de expressar alguns sentimentos em público, como andar de mãos dadas com o meu namorado, beijá-lo e outras coisas normais que casais heterossexuais fazem em público.

D: Sei que fizeste teatro durante muitos anos. É a saída do armário um processo semelhante ao do actor que, nos bastidores, se despe de uma personagem no final de uma peça de teatro? Já passaste por essa metamorfose? Que impacto teve na tua vida?

J: Eu penso que o sentimento poderá ser parecido mas contextualmente diferente; no teatro um actor interpreta uma personagem, que por mais que tenha a ver consigo nunca é a sua própria personalidade, o seu “eu”. Pois eu nunca fui um “actor” da minha vida. Sempre tentei viver segundo os meus princípios, respeitando a minha integridade e preservando os meus valores. Mas uma grande parte de mim era escondida: a minha orientação sexual. Tê-la revelado ao entrar para a faculdade, foi como encontrar a minha “plenitude pessoal”, onde não há espaço para ressentimentos, vergonha, mentiras, omissões, atitudes e comportamentos controlados. Este foi o meu preço.

D: Muitas organizações, à semelhança do que acontece com a “Panteras Rosa”, encabeçam manifestações em defesa dos direitos da comunidade LGBT, como é o caso da parada gay. Qual a tua opinião acerca destes movimentos? Serão eles representações fidedignas e honrosas da comunidade LGBT ou, por outro lado, contributos para um estereótipo com conotação negativa? Já integraste algum?

J: Sinceramente, não me identifico muito com a ambiente e a filosofia vivida nessas paradas. Mas respeito, embora acredite que possam causar um estereótipo negativo na sociedade devido ao seu aparatoso e extravagante “espectáculo”. Poderiam haver outras formas de manifestação mais credíveis. Nunca integrei nenhuma e não era capaz de o fazer.

D: Qual a tua posição na adopção de crianças por casais homossexuais?

J: A favor. O amor e a convivência homossexual são uma realidade inerente à nossa sociedade e acredito que, tal como um casal heterossexual ou mesmo uma pessoa solteira, um casal homossexual poderá oferecer um lar onde haja amor, respeito, lealdade, assistência mútua e todas as possíveis condições necessárias à felicidade uma criança.

D: O casamento entre homossexuais é ainda proibido em Portugal. De que forma vai isso de encontro aos teus planos? Sonhas em constituir família?

J: O casamento nunca fez parte dos meus planos. Mas sonho em um dia assentar com uma pessoa e em constituir uma família.

D: Manuela Ferreira Leite disse em declarações ao Diário de Notícias: “Há com certeza aspectos jurídicos que podem ser regulados entre a relação de duas pessoas do mesmo sexo, desde que não se lhe chame casamento. Chame-se-lhe qualquer outra coisa, arranje-se um nome. Agora, com o baptismo de casamento... comigo não, com certeza.". Ao que tu respondes …

J: Sem comentários. Há que chamar as coisas pelos nomes. Não estará a ser um pouco contraditória? Penso, que com políticos destes a liderar partidos políticos, o país não irá para frente.

D: És católico? O que pensas da oposição da Igreja à prática da homossexualidade?

J: Se uma igreja que prega a palavra de Deus e afirma que o amor ao próximo é uma bênção aos olhos do Pai maior, condena a forma como parte dos seus filhos amam e são amados é, no mínimo, antagónica, contraditória e fútil. Se ela afirma que a forma que eu vivo é errada, reservo-me ao direito de dizer que tal igreja não passa de uma casa reprodutora de hipocrisia e um lugar profano.

D: O mundo homossexual é, à semelhança do que rezam os estereótipos, marcantemente promíscuo?

J: Por experiência própria, no mundo homossexual, a rapidez entre o conhecer-se e o ir para a cama é muito maior do que no heterossexual. Penso que isto acontece porque o sexo masculino, naturalmente, apresenta menos constrangimentos/impedimentos e o sexo e a troca de parceiros é visto de uma forma mais aberta. Acredito e penso que no mundo heterossexual também existe promiscuidade, só não é tão evidente.

D: Um desejo para 2009 …

J: Compreensão, respeito e tolerância.

A melhor foto da praxe vai para...

Telma Miragaia
Aluna do 5º ano na FCS (Medicina)

Impertorum versus Caloiro

Imperatorum Pedro Manquinho (Engenharia Aeronáutica)

1. Faço um balanço positivo, quer em termos de comportamento durante o tempo de praxe, quer em termos de espírito.
2. Como é óbvio não tem lógica alguém praxar dentro de salas de aulas, nos académicos, etc. E foi isso que o reitor quis deixar claro. O problema é que por vezes as pessoas não sabem ler as coisas bem.
3. Aos praxantes: lembrem-se que já estiveram do outro lado e que sigam a máxima “não faças aos outros o que não gostas que te façam a ti”. Aos caloiros: que se divirtam.

Diagnóstico

1. Que balanço fazem da praxe 2008 na UBI?
2. Este ano foi especialmente marcado pela limitação da praxe nas instalações da Universidade. Algum comentário sobre o assunto? Aspectos positivos e negativos.
3. Querem deixar alguma mensagem para os praxantes e para os futuros caloiros?

Caloiro (Carlos Santos, Economia)

1. Aspectos positivos: fortes amizades, espírito de grupo, o conhecer-se muita gente e a grande integração. Aspectos negativos : um pouco cansativo, sujar-se e/ou estragar-se muita roupa.
2. Em relação a isso nao tenho nada contra nem a favor; tanto sou praxado dentro como fora da Universidade. Também, tudo depende do tipo de praxe mas no meu caso nao me afectou em nada. Não sei se haverá aspectos positivos, mas o único menos positivo, que destaco, refere-se à parte das refeições: se tivermos que comer, por exemplo, a sobremesa, depois o prato principal e depois a sopa, nao saberá muito bem (risos).
3. Aos praxantes: não tenho nada a dizer pois acho que fui muito bem praxado e adorei as praxes. Aos caloiros: entrem no jogo e adaptem-se.


Joana Cardoso
Aluna do 3º ano da FCS (Medicina)

E(I)NEM

"Viva o ENEM!" foi o mote para 3 dias inesquecíveis. Tudo começou com uma viagem interminável de 12 horas de autocarro que antecipava a euforia e loucura que nos esperavam em Guardamar del Seguro. As festas foram fenomenais, principalmente a dos “Vilões das História” onde muita gente deu asas à imaginação e as actividades desportivas ajudaram a ultrapassar a ressaca. A única coisa a lamentar foi o comportamento irracional de alguns colegas que quase arruinou a nossa estadia, mas nada que o trabalho sobre-humano da Comissão Organizadora não conseguisse controlar. Balanço? Extremamente positivo!


Vânia Gomes
Aluna do 5º ano na FCS (Medicina)

Hablar de España es hablar de...

Monarquia
Plaza Mayor
Ricardo Zamora
ETA
Paella
Barcelona
Sevilhanas
Flamenco
D. Juan, o Conquistador
Picasso
Paseo del Prado
Antoni Gaudi



Cláudia Faria
Aluna do 3º ano da FCS (Medicina)

Dic@

Acabaram de pensar “vou ver ao Google Earth” mas não têm permissão para instalar o programa nos computadores da faculdade? Então, maps.google.com. Divirtam-se…


Luís Patrão
Aluno do 6º ano na FCS (Medicina)

Para Pensar...

Doente do sexo masculino, 46 anos, dirige-se ao hospital alegando cansaço fácil com dispneia. Trata-se de um doente diabético, hipertenso, com hipercolesterolémia, dispneia a pequenos esforços, náuseas, vómitos, enfartamento pós-prandial desde há 2 semanas e massa abdominal pulsátil agravada desde então. Faz metformina (850mg, 1comp. 2 vezes/dia), ácido acetilsalicílico, (100mg, 1comp./dia), rosuvastatina (10 mg, 1 comp./dia), telmisartan e hidroclorotiazida (80/12, 5 mg, 1 comp./dia). Antecedentes médicos: enfarte agudo do miocárdio e revascularização coronária. Antecedentes cirúrgicos: extracção de quistos nas cordas vocais, amigdalectomia e colecistectomia . Antecedentes familiares irrelevantes. Exame objectivo: estado de consciência (doente consciente, vigil, lúcido, orientado no espaço e no tempo, colaborante, comunicativo e com discurso fluente); pulso radial (108 ppm, amplo, regular, rítmico, simétrico e síncrono com os batimentos cardíacos); frequência respiratória (21 cpm); temperatura (36,5ºC); TA medida em decúbito dorsal (TA MSE: 150-81 mmHg); percursão torácica (som claro pulmonar normal); auscultação torácica (murmúrio vesicular mantido em ambos hemitóraxes, sem ruídos adventícios, S1 + S2 rítmicos, não sendo audíveis sopros ou atritos pericárdicos); abdómen não globoso, com cicatriz umbilical centrada, sem deformações visíveis, móvel com os movimentos respiratórios; palpação (massa de 5cm de diâmetro, pulsátil, expansível, de contornos regulares e consistência elástica, localizada na região paramediana esquerda, compreendida entre a cicatriz umbilical inferiormente e o rebordo costal superiormente, sendo possível palpar o bordo superior); percursão abdominal (timpanismo normal em todos os quadrantes abdominais); auscultação abdominal (ruídos hidroaéreos mantidos e normais). O diagnóstico definitivo é aneurisma da aorta abdominal infra-renal de provável causa aterosclerótica, com trombo intra-mural.

A que exames complementares recorreria para comprovar este diagnóstico?

P.S.: A resposta sairá na próxima edição do diagnóstico.

Sim, é possível!

Barack Hussein Obama considerado por muitos o Sr. que tem nas suas mãos o futuro do Mundo, teve um percurso de vida peculiar.
Obama nasceu em Honolulu, Havai, a 4 de Agosto de 1961. Filho de um economista queniano e de uma antropóloga estaduniense branca oriunda do Kansas. Após o divórcio dos pais, quando Obama tinha apenas 2 anos, o pai regressou ao Quénia onde prosseguiu uma carreira política importante. Morreu em 1982 vítima de um acidente de automóvel.
A mãe casou com um indonésio em 1967 e a família mudou-se para Jacarta, onde Obama estudou em várias escolas (muçulmanas e cristãs) até aos 10 anos. Regressou a Honolulu , onde viveu com os avós maternos, até aos 18 anos, recebendo vistas frequentes de sua mãe que viajava até ao Havai em questões de trabalho. A mãe morreu em 1992 vítima de cancro.
Após o Ensino Secundário Barack Obama estudou no Occidental College, em L.A.; aos 20 anos transferiu-se para a Universidade de Columbia, em N. Y., onde se graduou em ciência política com especialização em relações internacionais. Aos 22 anos obteve o título de bacharel de artes, quando trabalhou um ano na empresa “Business International Corporation” e depois na Organização sem fins lucrativos “New York Public Interest Research Group”. Ainda hoje faz parte do grupo que publica a revista “The Economist” .
Relegando para segundo plano o curso de direito e as suas actividades, em 1985 mudou-se para Chicago (aos 24 anos) e trabalhou como agente comunitário num grupo religioso (director da “Developing Communities Project”) até 1988, onde coordenou variadas actividades tendo como objectivo melhorar as condições precárias daqueles bairros, devidas ao crime e elevada taxa de desemprego. Ingressou, no final de 1988, na Universidade de Harvard onde, em 1991, se licenciou em Direito, tendo sido o primeiro presidente afro-americano da revista “Harvard Law Review”.
Volta para Chicago, onde conhece a sua futura mulher Michelle (casa-se em 1992) e trabalha como advogado de direitos civis e professor de direito constitucional na Universidade de Chicago (durante 12 anos). Para além disso, entre 1992 e 2002, foi membro da mesa de diversas organizações e fundações contribuindo com melhorias para a sua comunidade.
A política esteve sempre no seu horizonte e cedo se apercebeu que para fazer mudanças não bastava apenas a nível local, mas sim a nível das leis e politicas nacionais. Em 1992, trabalhou no recenseamento eleitoral para o Partido Democrata. Depois de um notório trabalho como advogado e líder comunitário, concorreu para o Senado do Illinois em 1994 e foi eleito senador sem qualquer oposição do Partido Democrata. No ano de 2000 a sua carreira política sofreu o primeiro contratempo, pois Obama candidatara-se pelo estado de Illinois ao Senado dos E.U.A. mas perdeu na primária democrata contra Booby Rush (candidato apoiado por Bill Clinton). Isto não o fez abrandar e prosseguiu a sua brilhante carreira no senado estadual, contribuindo para a formulação de diversas leis de elevada importância relacionadas com os cuidados de saúde, uso de armas, guerras do Iraque e Afeganistão, entre muitas outras.
Em 2004, voltou a fazer campanha para o Senado dos E.U.A. e, embora os seus oponentes parecessem em melhor posição para ganhar esta corrida, devido a variados escândalos e ao forte carisma e convictas ideias de Barack Obama, este rapidamente viu a sua vantagem alterada. Na Convenção Nacional Democrata de 2004 captou todos com o seu dom da retórica e proferiu um eloquente discurso onde afirmava: “There’s not a liberal America and a conservative America, there is the United States of America. There’s not a black America and white America and latino America and asian America, there is the United States of America”. Após este brilhante discurso, vários analistas políticos já o consideravam uma personagem a ter em conta no futuro cenário político norte-americano, e possivelmente como futuro presidente. Venceu estas eleições por uma grande diferença do seu oponente e tornou-se no terceiro afro-americano desde a Reconstituição a ser eleito para o Senado dos E.U.A..
A 10 de Fevereiro de 2007, declara-se candidato do Partido Democrata às primárias para Presidente dos Estados Unidos da América, tendo como adversária a tão mediática Hillary Clinton. Durante vários meses Barack Obama e Hillary Clinton foram protagonistas de uma renhida disputa, que culminou com a vitória de Obama, que obteve o apoio dos mais variados estados. Em Agosto de 2008 foi nomeado oficialmente para concorrer à Casa Branca contra o experiente candidato republicano Jonh McCain. A 4 de Novembro do mesmo ano, Barack Hussein Obama foi declarado o 44º Presidente dos E.U.A, o primeiro afro-americano a conquistar tão poderoso cargo.Homem de fortes convicções e crenças, cidadão do mundo, lutador, corajoso e defensor aguerrido da sua comunidade e país, Barack Obama conquistou o coração de todos os americanos que votaram nele e de todas as pessoas que por esse mudo fora depositam nele esperança de um unificador e gerador de mudança para o mundo. Poderemos mesmo afirmar que o “I have a dream…” proferido por Martin Luther King terá sido respondido por um “Yes We Can” de Barack Obama, porque, de facto, ele já conseguiu realizar parte do Sonho.



Rita Ivo
Aluna do 3º ano da FCS (Medicina)

Singularismo Bush versus Obama

A impossibilidade de julgar eventos que ainda não ocorreram é evidente. Contudo, a avaliação do conteúdo do discurso de uma figura política dá azo a diversas interpretações do que é dito, tanto implícita como explicitamente. Consoante essa avaliação ficamos perante possíveis caminhos a percorrer tanto no campo da política doméstica como externa. No caso do presidente-eleito Obama, probabilidades e ideias-comuns perderam muito do seu peso. Obama, filho de um casal interracial americano, com uma infância humilde, conseguir chegar ao posto mais alto do executivo da nação-estado mais poderosa do planeta é um feito histórico. Não tanto demarca uma quebra com a ideia-comum da presidência americana – que conta com um americano proveniente de uma família estruturada nos fundamentos neoconservadores característicos desse país, caucasiano, educado nas melhores e mais prestigiadas universidades americanas, rico – como demonstra um afastamento da escravatura e segregacionismo outrora vividos. Alguns apontam a vitória de Obama contra McCain como um voto de censura contra o Partido Republicano e, em particular, ao Presidente George W. Bush. Esta vitória não assenta necessariamente no panorama político desse país visto apenas um terço dos eleitores caracterizarem-se como liberais/progressistas, mas na renúncia do ‘singularismo Bush’, na excepcionalidade dos seus dois mandatos como Presidente. Este singularismo denuncia-se pelo uso do chamado ‘hard power’, caracterizado pelo uso do confronto e por intervenções militares. Toda a argumentação de Obama, exemplo de mudança e quebra com o status quo, depende de considerarmos a América sob o controle de W. Bush como um soluço a dois tempos – um equívoco de dois mandatos – ou uma continuação do exercício hegemónico americano. Costumes à parte, pergunto-vos o seguinte: que Presidente americano bombardeou o Iraque, atacou o Afeganistão e começou uma guerra sem o aval do Conselho de Segurança das Nações Unidas? Decerto a resposta que a muitos ocorreu foi W.Bush, prova da tal ideia de ‘excepção’, de quebra com uma política externa americana mais suave. Àqueles que responderam W. Bush digo-vos que estão equivocados, pois foi Bill Clinton quem o fez em primeiro lugar. Clinton bombardeou o Iraque usando argumentos semelhantes ao que W. Bush viria a usar – que Saddam Hussein não deveria ser capaz de intimidar as nações-estado vizinhas com armas nucleares e biológicas – atacou o Afeganistão e o Sudão em 1998 em resposta a ataques terroristas contra embaixadas americanas em África e, em 1999, atacou a Jugoslávia sem o aval do Conselho de Segurança. Não é verdadeiro afirmar que W. Bush foi singular nas medidas que tomou durante os seus mandatos na Casa Branca. No entanto, W. Bush foi singular na maneira como chamou a si o medo sentido na América após os ataques de 11 de Setembro e, em particular, através dos métodos e da eloquência – ou falta dela – quando justificou as acções que viria a tomar em relação ao Afeganistão e Iraque. A questão que colocamos é se a presidência Obama será porventura um exemplo de ruptura com o passado. Não tendo ainda obra feita – sem contar com os pequenos passos dados como a escolha de alguns elementos para o seu governo como é o caso de Hillary Clinton – podemos apenas analisar discursos, manifestos políticos e intervenções feitas por Obama. Em agosto de 2007, num discurso que fez sobre segurança, clima e energia, Obama deixou transparecer o seu lado mais realista. Falando do incremento no número de conflitos a nível global devido às mudanças climáticas e nos possíveis 250 milhões de ‘refugiados climáticos’, Obama retorquiu que a responsabilidade de liderar os esforços globais caiam sobre os Estados Unidos da América pois são actualmente o maior produtor de gases nocivos para o ambiente. Não obstante, assegurou momentos depois que a China ultrapassará a América em pouco tempo no que toca a este assunto. Ora Obama admite as falhas dos governos que o antecederam, como a não ratificação do protocolo de Kyoto, peça fundamental na luta contra a crise ambiental, assumindo assim um papel que o demarca realmente de W. Bush e afins, ora sublinha que dentro em pouco a América já não será a ‘pior’, mas sim estando entre as ‘piores’ e, por conseguinte, um alvo menos válido de críticas. Além do mais, garante que embora o desafio seja avassalador, este trará benefícios para a economia americana. Acrescenta, portanto, que em 2050 o mercado global de ‘energia verde’ terá o valor de 500 mil milhões de dólares, o que trará benefícios para corporações americanas na formulação de (novos) mercados passíveis de exploração. Podemos inferir que o interesse implícito neste discurso é o de acrescentar capital à economia americana mesmo que isso seja à custa de retórica e da exploração do que Obama denomina de ‘exportação de promoções’ para países em vias de desenvolvimento dando azo, assim, à criação dos tais mercados futuros de energia verde. Podemos, contudo, aceitar que toda o conceito de mudança que Obama propôs é mais que mera retórica política. No mesmo discurso, Obama deixa-nos saber que só através do reforço de instituições, de alianças e parcerias, leia-se Organização das Nações Unidas e Parceria Transatlântica Europa-América, é que respostas viáveis aos problemas actuais de ordem internacional podem ser atingidas. Este ressurgimento do supranacionalismo – instituições acima do Estado mas em sociedade com o último – são inequivocamente contrárias às posições de W. Bush. É um avanço claro. Os desafios que enfrentamos nos dias que correm necessitam de respostas que envolvam os vários actores do panorama político, sejam nações-estado, Organizações Não Governamentais (ONG), grupos de lobbying, think tanks e corporações, de modo a coordenar as acções a tomar. Não há espaço para unilateralismo errático quando estão em causa situações que afectam o planeta no seu todo. Não há lugar para mero bilateralismo Europa-América. Não há tempo para novos Iraques; o tempo de agir é agora. A resposta tem de ser sonante, forte, coordenada e sustentada. Embora não considere que Obama seja uma figura transformadora do ponto de vista quase messiânico que lhe foi adjudicado; não obstante considerar que Obama reflecte muitas das características de presidências anteriores, tanto na maneira de pensar como, presumivelmente, de agir, não posso deixar de acreditar que a presidência Obama investirá a América com uma política externa mais vocacionada para a diplomacia e pragmatismo político – soft power – tão necessária para a estabilidade do planeta que chamamos de Nosso. Votaria em ‘Obama’ tanto hoje como, suponho, amanhã.



Rui Gomes
Aluno do 4º ano da University of Stirling (Ciência e Política)

Calinadas

“A absorção ocorre ao longo da bicha” (Será víscera?)


“Realizar a auto-apalpação da próstata.” (Há coisas fantásticas, não há?”)


“Falemos das questões da morte de morrer.” (E das de viver, não?)


Um aluno do segundo ano: “Espermatócitos nos pulmões?”
O professor: “Cuidado não se engasgue!”
(Ups…)


Quando alunos cantavam os parabéns a um colega, em frente a uma sala onde decorria uma aula, o professor: “Cantem os parabéns em código morse, pode ser?”